O caso de que mais se fala aqui, amigo, é de um casal que se desquita; o que seria vulgar se toda a roupa suja não fosse lavada pela imprensa e pelo rádio. Ambos os cônjuges, são artistas, e dos mais populares. Em Paris também tem havido casos assim; e então a imprensa de Paris costuma dizer, com ironia, e talvez tristeza, que se trata de um processo “bem parisiense”. Pois este caso é “bem carioca”, no pior sentido da palavra. Se é que ela tem algum mau, o que não desejo crer. Não participo da indignação de uma velha senhora minha amiga que me diz morrer de vergonha com essas coisas; se morre gosta de morrer, e muito, pois a verdade é que não desgruda os olhos do jornal nem o ouvido do rádio. Também não chego a aprovar a impressão de outra senhora, amiga dela, que diz ser toda essa indignação puro despeito. Pois –argumenta se o próprio casal é que conta tudo e conta logo a todo mundo, que será das pobres tias mexeriqueiras?
Mas não é apenas essa nobre função que a imprensa usurpa; a educação estética e sentimental de nossa juventude tem sido incrementada por várias revistas que se especializam em apresentar, além de desenhos livres com legendas picantes, fotografias de damas nuas. Você me dirá que isso é velho. É porque você não viu. Em nosso tempo de rapazes também havia revistas com senhoras nuas. Eram, talvez, vendidas com mais discrição: mas a diferença principal não é esta. As mulheres nuas de nosso tempo eram anônimas e provavelmente estrangeiras: em todo caso só pareciam existir mesmo no papel, em sua qualidade de mulheres nuas. Em resumo: podiam ser emocionantes, mas eram apenas fotografias. As de hoje, meu caro, não. Elas existem. São conhecidas, aparecem com seu nome, moram nesta cidade, são pessoas. A gente as encontra uma vez ou outra. Isso é que me parece terrível. Veja o caso dessa linda artista que soube que um bandido era admirador seu e tinha suas fotografias nas paredes do cubículo. O homem fugiu da cadeia, mas foi preso outra vez. E a moça lhe mandou então, para seu consolo (dizia assim na cruel dedicatória) uma nova fotografia sua. O jornal deu a clichê, que a mim, apesar de não ser preso e de já haver atingido uma idade, digamos assim, imunizante – a mim mesmo de certo modo me perturbou.
O que tudo me dá uma grossa tristeza: a metade é tristeza moral, pois não sei onde irão parar os costumes. A outra metade eu conto aqui apenas entre nós, pois se não chega a ser imoral (em nossa idade, hélas! – isso não teria mais sentido) também não é edificante: confessarei, diante da fotografia tão generosa dessa moça loura, que as tentações de hoje são ainda mais tentadoras que a de nosso tempo. O que é horrível de pensar e de dizer. O melhor é mudar de assunto, ou acabar aqui esta crônica já longa que vai derrapando para todas as melancolias sem virtude.