Maria Julieta Drummond de Andrade, tão comprido nome para tão jovem escritora, acaba de fazer a sua estreia literária. Uma pequena novela — A busca — é o volume que, como se diz, está agora diante do olhar erudito da crítica. Que pode, entretanto, a crítica contra a mocidade de Maria Julieta? Nada, não pode nada. A juventude que jorra das páginas de A busca inunda a mesa em que o crítico escreve, sobe aos olhos do crítico, arranca-lhe os óculos e afoga seus austeros pensamentos.

Entretanto, se deste naufrágio da análise e dos conceitos sobrar-nos alguma lucidez, só podemos utilizar-nos dela para louvar o que há de excepcional na novela de Maria Julieta, a sua sinceridade, a intimidade com que ela se move no país das palavras, certos momentos em que o seu livro deixa de ser um caderno de impressões da adolescência e entreabre um instante o mundo mais sério que, por enquanto, a autora apenas adivinha.

Explico-me: não creio que um “mundo”, para a literatura, possa ser mais importante do que qualquer outro; que, por exemplo, o mundo das paixões esteja colocado hierarquicamente acima do reino minucioso que uma criança pode descobrir no quintal de sua casa. Não é a isso que me refiro. Para a literatura, não há temas mais sérios do que outros.

O que se pode notar em A busca é uma seriedade maior de tratamento, ou seja, uma maneira mais contundente de exprimir, uma possibilidade de manter a “pressão” emotiva que, por vezes, oprime e delicia os leitores.

Seria tolo dar conselhos a Maria Julieta. Porém, porque estas qualidades excepcionais existem, e porque elas representam um modo de ver bastante pessoal, acreditamos que a autora se dirigirá naturalmente para o campo oposto ao em que o romance moderno brasileiro ainda está tecendo as suas glórias. Ou seja, Maria Julieta se mostra muito credenciada para não repetir a geração anterior de novelistas brasileiros. Isto é o mais importante, não só porque apenas a desobediência pode indicar a um jovem escritor o seu lugar, como também porque, sem movimentos de rebeldia em nossa literatura, estamos arriscados a perecer na “censura” que os mais velhos exercem sobre os mais novos.

Que mais nos falta para dizer sobre A busca? Naturalmente, dado o pouco que já dissemos, tal pergunta parece subestimar o valor da novela. Mas não se trata disso. A nossa interrogação é mais interjetiva do que outra coisa. De fato, tudo o mais que se pode dizer sobre esse livro deve figurar no capítulo da admiração. Temos que admirar, sobretudo, e já o disse Rubem Braga, a honestidade da autora. Não se tem o direito de ser honesto literariamente aos dezessete anos. A comoção confusa da idade, o pressentimento de estar entrando em um túnel já sem comunicação possível com os homens, não nos permite o luxo de ser honestos na adolescência: ficamos meio bestas com o nosso inimaginável desamparo. Maria Julieta, porém, rompendo as imposições, consegue ser de uma sinceridade madura e completa.

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