Publicada no livro Bom dia para nascer, Companhia da Letras, 2011.
Tema velho como a sé de Braga, esse do plágio. Ou plagiato. “Plagiarius” em Roma era o sujeito que roubava escravos. Ou o cara que comprava e vendia como escravo um cidadão livre. O sentido figurado passou às letras e às artes. É uma história exuberante, a dos plágios. E farta é a jurisprudência, já que a controvérsia às vezes só acaba no tribunal. Se não está às escâncaras, o plágio é um gato escondido com o rabo de fora. Hoje se fala em “intertextualidade”, como ontem se fazia às claras “à la maniere de”. Também às claras se faz a paródia.
Na nossa música popular já se disse que samba é como passarinho: é de quem pegar primeiro. Falar nisto, outro dia um leitor escreveu ao Jornal do Brasil para denunciar o Vinicius, que copiou o verso “que seja eterno enquanto dure”. Diz ele que é de Henri Régnier: “L’amour est éternel... oui, tant qu’il dure”. Pode ser coincidência, por que não? Ou reminiscência inconsciente. Não há tema novo. Há nova maneira de abordar os velhos temas.
O plágio talvez passe mais despercebido quando se dá no campo das ideias, ensaio ou erudição. Fica difícil às vezes dizer aí o quê é de quem, se os dois lados têm bagagem. O que não pode é ter a mala vazia. Apanhado com a boca na botija, o réu esperneia. Não dá a mão à palmatória. Calado é que não pode ficar. Quem cala consente. Na disputa de uma cátedra universitária, a acusação pode ter um desfecho trágico. Em matéria de tese, todo cuidado é pouco. Já houve caso até de suicídio.
Na literatura por toda parte há antecedentes ilustres. O Eça foi acusado com O crime do padre Amaro de plagiar o Zola de La Faute de l’Abbé Mouret. Grande repercussão teve entre nós nos anos 40 a acusação de Carolina Nabuco. Rebecca, da inglesa Daphne du Maurier, era cópia do seu A sucessora, de 1934. Álvaro Lins concluiu que era mesmo. E o Correio da Manhã botou a boca no trombone. Mas a tese caiu na Justiça.
Com Joan Fontaine, Rebecca deu um filme de êxito mundial. Manoel Carlos fez de A sucessora uma telenovela para a Rede Globo. Foi sucesso aqui e lá fora. Agora, mal começou Pedra sobre pedra e surge a acusação. É plágio de Roque Santeiro (Dias Gomes) e de Tieta do Agreste (Jorge Amado). Há quem diga que o plágio é a base de todas as literaturas, com exceção da primeira, que é desconhecida. Quem disse isto? Não foi o Claudio Humberto. Foi Jean Giraudoux, dramaturgo francês que morreu em 1944.