Fonte: Caderno B, Jornal do Brasil, de 21/10/1969.

Para bem viver é preciso chegar aos 30 anos com a satisfação de se ter permitido todas as loucuras imagináveis na juventude. Principalmente no capítulo das mulheres. E só frequentar os amigos que suportam os nossos defeitos.

Recomenda-se também uma boa gargalhada, a sós, no momento de se erguer da cama: “Quanta bobagem tenho feito neste mundo! Quá, quá, quá”! A seriedade imperturbável conduz ao fanatismo e este dá câncer.

Nenhuma preocupação burguesa ou pequeno-burguesa como, por exemplo, o medo de perder o emprego ou bens; nenhuma ambição material, fora as indispensáveis (casa, comida, roupa lavada), ou então que seja gratuita: juntar dinheiro para algum dia comprar um iate ou passar dois anos zanzando pela Europa.

Nunca ferir uma mulher a ponto de fazer-se odiado por ela. O homem inteligente é o que sabe transformar antigos amores em sólidas amizades. Estar sempre em condições morais de perder tudo e recomeçar tudo outra vez. Interessar-se por tudo, principalmente por aquilo que não nos diz respeito. Amar apenas uma mulher de cada vez. Dizer sempre a verdade, seja qual for e doa a quem doer. Conhecer um por um os nossos defeitos, curar-se dos que são mais naturais e cultivar aqueles que mais nos agradam.

Evitar ao máximo o paletó e a gravata, os chatos que falam no ouvido, as mulheres que resolvem tudo pelo telefone, os bêbados que mudam de personalidade quando lúcidos, os vizinhos muito prestativos e todo o papo do qual participam mais de três pessoas.

Longa caminhada solitária pelo menos uma vez por semana. Não discutir preços — é melhor ir embora sem comprar. Não guardar ódio a ninguém. Dormir oito horas e, acordando, continuar na cama enquanto puder. Recusar-se terminantemente a beber uísque que não seja escocês legítimo, preferindo a cachaça como alternativa. (Isso vale apenas para quem gosta de beber e bebe frequentemente, como é o caso do autor. Neste caso, a aceitação de qualquer bebida é moralmente inquietante, pois atravessa a fronteira que separa o prazer do vício).

Ser condescendente com o comportamento sexual dos outros. Tentar compreender cada pessoa, evitando julgá-la. Saber exatamente o momento em que os amigos gostariam de estar sós. Ter caráter bastante para reconhecer as qualidades positivas de um eventual inimigo. Treinar, como quem faz ginástica, para ser sinceramente modesto. Saber contar com irreverência histórias em que faz papel de bobo e que tenham acontecido realmente.

Viver tão intensamente que possa dizer quando a morte vier: “Já veio tarde”.

jose-carlos-oliveira