Humberto no país da crônica

A seca, represa da Usina de Três Bocas, Londrina, Paraná-PR, 1959. Foto de Haruo Ohara/ Acervo Instituto Moreira Salles.

Durante cerca de quatro anos, da inauguração deste Portal em 2018 aos finalmentes de 2021, nossos leitores encontravam aqui, neste mesmo espaço, uma coluna impecável de Humberto Werneck, responsável por dar a cara e o sabor aos escritos que, em homenagem ao famoso ensaio do professor Antonio Candido, convencionamos chamar de “Rés do chão”. Ao todo, Humberto publicou 80 textos, todos convidando o transeunte da internet a dar uma passadinha pelas crônicas do acervo. Sete anos depois, em comemoração justo aos 80 de seu autor, nasce um livro que reúne essa produção: Viagem no país da crônica, publicado pela Tinta-da-China Brasil.

Naturalmente, para se despregar da tela e preencher o papel, as colunas passaram por revisão e readequação, mas mantiveram sua essência – o espírito de flanar pelas ruas ao lado de nossos cronistas. Mais do que uma leitura prazerosa, o livro resultou num repositório importante da crônica, recheado de curiosidades e boas histórias sobre o gênero e seus praticantes, numa cadência que só um cronista experiente como Humberto saberia manejar.

Se você embarcou por aqui recentemente e ainda não se aventurou pelas páginas mais antigas do “Rés do chão”, saiba que está perdendo bastante. Qualquer um daqueles textos servem como prova da prosa fina de Werneck. Recomendamos começar bem do início: experimente ler “Crônica & aguda”, sua estreia no Portal. Já estava ali, desde o primeiríssimo momento, a disposição de um entusiasta para revelar preciosidades em textos alheios. Sem aviso prévio, saímos de cada texto sabendo um pouco mais. São pequenas aulas de literatura brasileira. Mas aulas culposas, isto é, dadas sem a menor intenção de ensinar. Aprendizagens ao rés do chão, bem ao gosto da crônica.

Veja também, em “A arte de despiorar”, como Humberto se debruça sobre alguns fac-símiles de recortes anotados pelos cronistas, para comparar diferentes versões de um mesmo texto. Essa atitude detetivesca, bastante prazerosa para quem sabe a importância de buscar sempre a palavra exata, remonta os caminhos de um autor até chegar no texto definitivo, transformando rabiscos em labuta árdua. “Não se trata, creia, de delinquência literária”, avisou, “mas de procedimento comum, desde sempre, entre os profissionais”. É o que deixam claro os apontamentos de Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos, e Rubem Braga. Diga, leitor, onde mais é que se pode encontrar uma iguaria dessas tão bem servida assim?

Esses textos que destacamos são apenas amostras do que se encontra em Viagem no país da crônica. Assim como acontece com as crônicas quando passam para o livro, eles cresceram, deram flor e estão mais fortes. Os leitores de São Paulo podem participar do lançamento da obra na Feira do Livro, às 12h do dia 20 de junho. Haverá uma conversa entre o autor e Luís Henrique Pellanda na praça Charles Miller, aquela defronte ao estádio do Pacaembu. Lá, você pode adquirir o seu exemplar e aproveitar a sessão de autógrafos. E, como o próprio Humberto costuma dizer: “Se não gostar, eu reembolso – e rompo relações literárias”.